Por que as unidades HIS se tornaram “ervas daninhas” do mercado imobiliário em SP

As HIS — Habitações de Interesse Social — foram criadas para resolver um problema histórico: viabilizar moradias dignas para famílias de baixa renda em regiões urbanas bem localizadas.
Mas, nos últimos anos, esse instrumento se transformou em algo bem diferente. O que deveria ser uma ferramenta de inclusão se tornou uma fonte de distorção no mercado imobiliário paulistano — com projetos desvirtuados, compradores enganados e até investigações em andamento sobre a comercialização irregular dessas unidades.

1. A promessa e o incentivo urbanístico

O modelo HIS permite às incorporadoras construir acima do limite básico previsto na lei — ou seja, elas ganham potencial construtivo adicional (CA ampliado) em troca de reservar parte do empreendimento para moradia social.

Em teoria, é uma troca justa: o poder público concede o benefício urbanístico, e o privado entrega unidades acessíveis a quem mais precisa.
Na prática, porém, muitas incorporadoras usaram o mecanismo de forma oportunista, sem garantir que essas moradias fossem realmente destinadas às famílias de baixa renda.

2. O uso irresponsável e a falta de transparência

Em diversos empreendimentos, compradores adquiriram unidades sem saber que se tratavam de imóveis com restrições de revenda e ocupação.
Corretores e incorporadoras, muitas vezes, omitiam as limitações impostas pelo programa, vendendo as unidades como se fossem produtos comuns de mercado.

Hoje, o tema é alvo de CPI na Câmara Municipal de São Paulo, que investiga a produção e comercialização irregular de unidades HIS e possíveis práticas enganosas na venda desses imóveis.
Ou seja, o problema não é apenas urbanístico — é também ético e jurídico.

3. Projetos desalinhados com o público-alvo

Outro erro grave foi o descompasso entre a proposta social e o produto entregue.
Muitas construtoras projetaram unidades de 20 a 25 m², sabidamente inadequadas para famílias que, em muitos casos, têm 3, 4 ou 5 pessoas.
Esses apartamentos, embora formalmente classificados como HIS, nunca foram pensados para uso familiar — mas sim para jovens investidores ou locações temporárias, fugindo totalmente da finalidade do programa.

Desde o desenho do projeto, a lógica já era especulativa: usar a tipologia HIS como instrumento de ganho de área construída e de marketing, não de inclusão habitacional.

4. O efeito colateral no mercado e na confiança do comprador

Esse uso distorcido criou estoques de imóveis travados, que não podem ser revendidos livremente ou financiados com facilidade, afetando a liquidez do mercado.

Além disso:

  • Há bairros inteiros saturados por produtos HIS que não atendem a demanda local;
  • A percepção de risco e insegurança jurídica aumentou entre compradores e investidores;
  • E o próprio objetivo social do programa foi esvaziado, afastando famílias que realmente precisavam dessas moradias.

Resultado: um mecanismo que deveria equilibrar o acesso à cidade acabou prejudicando tanto o mercado quanto a política pública.

Conclusão — e o que precisa mudar

As unidades HIS se transformaram em “ervas daninhas” do mercado paulistano porque perderam o equilíbrio entre política social e interesse privado.
Hoje, o modelo precisa ser revisado com mais transparência, fiscalização efetiva e punições para quem comercializa de forma irregular.

Enquanto isso, cabe ao comprador fazer sua parte: entender o tipo de imóvel que está adquirindo, checar a existência de restrições e, principalmente, buscar assessoria técnica independente para evitar armadilhas.

🔍 Na Quadra 4, nosso papel é justamente esse: analisar cada empreendimento com olhar técnico e imparcial, protegendo o comprador e garantindo que ele invista com segurança.